segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Tradição - Parte 2

Cruzmaltinos desse planeta,

em meu último post, acabei levantando uma discussão que rendeu um bocado (não aqui, mas no Orkut). O trecho da discórdia é esse:

Tradição - meus caros - não é bobagem. É o que separa os times grandes dos times medianos. Títulos qualquer um pode ganhar. Está aí o São Paulo Fashion Week, time criado ontem, que não nos deixa mentir. Daqui a dez, quinze anos, eles param de ganhar e a torcida volta àquele tamanhozinho que a gente conhece.

Enfim, afinal de contas, o que é Tradição?

Em primeiro lugar, não acredito que a definição convencional de tradição - "transmissão de práticas ou de valores espirituais de geração em geração, o conjunto das crenças de um povo, algo que é seguido conservadoramente e com respeito através das gerações." - possa ser aplicado nesse caso. Estamos falando de clubes tradicionais, e não das tradições dos clubes. Tradição - nesse sentido - é o Fluminense ir atrás dos jogadores do Vasco. É o Botafogo chorar ao fim de cada jogo. É o Flamengo conseguir as coisas com ajuda da arbitragem. Enfim, vocês entenderam. O que faria então um clube ser tradicional?

Pra mim, tradição tem a ver com um período mais romântico do futebol. Algum espaço de tempo ali, entre o início do século XX e o meio dos anos 50, quando tudo era pouco documentado, tudo era semi-amador... Um tempo em que o que movia o futebol era a paixão, e não o dinheiro. Um tempo que certamente tinha defeitos horrorosos, que os times jogavam sem ter o menor preparo, mas que - por estar envolvido nas brumas do esquecimento - permite as maiores idealizações. Afinal, é fácil idealizar aquilo que só se conhece de ter ouvido falar, cujas testemunhas são velhinhos simpáticos com mais memória afetiva do que real. É fácil dar asas pra imaginação quando se fala em Brasil e Uruguai, final da Copa de 50, e seus lances-chave registrados de maneira poética. Difícil é romantizar Brasil e Uruguai, das últimas eliminatórias, jogo truncado com dois gols de Luís Fabiano e seus 20 ângulos de câmera, que não deixam margens para dúvidas.


Tradição não se compra, e também não se perde. Uma vez que um time é tradicional, ele não deixa de ser. É como o próprio Uruguai: por mais que a última copa que eles conquistaram tenha sido em 1950, que o último título da Celeste tenha 15 anos, eles têm tradição. É diferente jogar contra eles do que jogar contra a Turquia. Não é preciso nem que se tenha sido um vencedor nos tempos da memória. Basta ter tido algum destaque. A Argentina, que só foi ganhar sua primeira Copa em 78, já era tradicional bem antes disso. Talvez por ter sido finalista em 30, talvez por ter vencido nove de suas catorze Copas América antes dos anos 50.

Por isso anões como América, Bangu, São Cristóvão, Olaria, Fluminense e Botafogo têm tradição, e grandes vencedores como São Paulo, Cruzeiro, Inter e Grêmio não têm. Suas maiores conquistas já são nos dias atuais. Nos ultra-realistas dias atuais. Não há margem para romantismo contra tantos registros.